quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Algumas questões sobre o poder local e a descentralização

Um dos argumentos contra a regionalização, ou qualquer outra forma de descentralização efectiva que aumente as prerrogativas do poder local, consiste no apontar de exemplos de autarcas corruptos e de autarquias endividadas. O caciquismo local é erguido como um fantasma que permanece nos mais recônditos lugares do "país profundo" e segue-se um encolher de ombros resignado e conformista em relação ao poder central e à macrocefalia que não pára de crescer.
As circunstâncias que deram, e dão, origem à corrupção e actos de gestão danosa das autarquais e demais órgãos do poder local são muito variadas e desde o 25 de Abril conheceu um agravamento, em parte, devido a alguma vacuidade legislativa e à ineficácia administrativa, face às novas atribuições e modo de eleição. Situação que levou à intervenção do actual governo, dando origem a nova legislação de eficácia e qualidade duvidosas.
A falta de consequências penalizadoras em relação a gestões danosas, os programas de financiamento disto e de mais aquilo e aqueloutro e os fundos estruturais que durante anos entraram via UE criaram todas as condições para uma mentalidade laxista e facilitista, quando não mesmo desonesta. A partidarização e as dificuldades criadas a listas não partidárias e o alheamento e falta de intervenção cívica por parte da população, em grande parte desenraizada do local onde vive, contribuem para a falta de controlo neste tipo de casos.
Mais razões poderiam ser aventadas, algumas com uma certa especificidade local e temporal, o que tornaria o presente texto ainda mais longo. O que se pretende aqui referir é que o aumento de responsabilidade, o que equivale a dizer de atribuições de poder executivo, não implica obrigatoriamente o aumento de corrupção passiva e/ou activa nem de gestões danosas. Quando vêm a lume os caso Felgueiras, Loureiros, Isaltinos e quejandos, o impacto mediático encobre todo o contexto de facilitismo e de más políticas nacionais as quais deram azo a tais actos. Por outro lado estes são exemplos do produto dos aparelhos partidários, os quais sempre tiveram acesso privilegiado ao órgãos de poder local.
As pessoas em geral, segundo estudos vários, são mais participativas e interventivas nos assuntos políticos, governativos e de utilidade pública quanto mais próximo e acessível sentirem o poder de decisão. Ora, este mesmo poder está na maioria dos casos muito distante do seu local de residência e os problemas que concernem a esse mesmo lugar têm muitas vezes de serem relegados para os órgãos de decisão central.
Neste sentido, não são as atribuições de poder que geram a corrupção mas sim a falta de vigilância e a demissão das forças activas locais. As responsabilidades de quem governa são sempre sacudidas para quem se encontra no patamar acima e nesse campo os autarcas, mesmo os mais corruptos, não podem responsabilizar-se por competências que não são as suas.
Por sua vez, o sistema de financiamento partidário, pleno de especificidades locais dá origem à criação de clientelas e de relações corruptas com alguns sectores, entre os quais a construção civil, imobiliário e a indústria.
Por conseguinte, antes de se proceder à dita regionalização, e começar a rasgar o território em mapas cor de rosa, dos quais nenhum agradará a boa parte da população afectada pelas divisões criadas, teria de haver alterações estruturais profundas e, mesmo, constitucionais. Por outro lado, os divisionismos regionais terão todos um carácter artificial propícios a criar novas "lisboas". Por isso, estou convicto que a melhor descentralização efectiva terá de ir ao encontro dos núcleos locais já criados e definidos ao longo dos tempos. Esse modelo será o municipalismo. Mas isto dará origem a outro texto...
Também publicado aqui.

2 comentários:

Antonio Almeida Felizes disse...

Caro Pedro Félix,

Dada a temática abordada, tomei a liberdade de publicar este seu "post", com o respectivo link, no
.
Regionalização
.

Cumprimentos

Pedro disse...

Sr. António Almeida


Obrigado pela preferência e pelo destaque.

Cumprimentos